Requisitos de Acessibilidade no meio Urbano e de Transporte Coletivo

POR CAROLINA STOLF SILVEIRA

A Lei Brasileira de Inclusão (Lei Nacional nº 13.146/2015), em seu capítulo sobre o Direito ao Transporte e à Mobilidade, artigos 46 e 48, expõe que devemos garantir igualdade de oportunidades no transporte e mobilidade da pessoa com deficiência com as demais pessoas. Da mesma maneira, a Lei Nacional nº 12.587/12, que institui as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, tem determinado que o usuário do transporte coletivo tem o direito de ser informado de forma gratuita e acessível. Além dessas, são diversas as leis e normas técnicas que visam assegurar o direito e acesso de todas as pessoas, incluindo as com deficiência, no sistema de mobilidade, tais como as leis nacionais 10.048/00 e 10.098/00, normativas da ABNT 9050/2015, 16.537/16, 14022/06, dentre outras.

Todavia, milhares de pessoas veem-se impedidas de utilizar os sistemas de transporte coletivo de suas cidades, seja pela péssima condição de caminhabilidade até os pontos de embarque, seja pela frota inacessível, seja pela falta de informação, sendo excluídas e impossibilitadas de exercer seu direito de ir e vir e buscar as oportunidades de estudo, trabalho, saúde, lazer, etc. oferecidas nas cidades.

Todos nós desejamos espaços acessíveis e agradáveis, que nos ofereçam baixo esforço físico, com uso flexível, simples e intuitivo, tolerância aos nossos erros humanos, nos trazendo segurança. Pessoas idosas, mulheres grávidas, pessoas com carrinhos de bebê, com andadores, muletas, com crianças de colo, e, particularmente as pessoas com deficiência físico-motora (como pessoas que necessitam de cadeira de rodas) ou sensoriais (como cegueira e surdez) são as mais atingidas pela falta de acessibilidade. É possível afirmar que as barreiras físicas e sociais impõem um exílio forçado às pessoas com deficiência.

Este artigo busca expor os principais requisitos de acessibilidade espacial a serem oferecidos em um sistema de transporte, baseados nos estudos que desenvolvi em minha dissertação de mestrado e tese de doutorado (podem ser acessadas neste link)(SILVEIRA, 2012 / SILVEIRA, 2017)

Apresenta-se a seguir, de forma sintetizada, esses requisitos, buscando também exemplificar como atender a legislação em vigor. Assim, para oferecer acessibilidade (incluindo informação ao usuário) em cada espaço de um sistema de transporte público e coletivo, precedido pelo a pé, para que todas as pessoas, inclusive as com deficiência e/ou mobilidade reduzida também sejam capazes de orientar-se e de o utilizarem com independência, recomenda-se:

Para o deslocamento a pé:
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– Calçadas ou passeios livres de obstáculos na faixa de circulação mínima de 1,20m (para que ao menos duas pessoas consigam caminhar). O revestimento empregado deve ser nivelado e contínuo (continuidade da rota em quadras e não apenas lote a lote), antiderrapante e não trepidante. O emprego do mesmo material facilita esse resultado, mas o assentamento com materiais diferentes também pode trazer as mesmas características;
– A pista tátil, com pisos táteis direcionais, no centro da faixa de circulação facilita o deslocamento e oferece maior sensação de segurança do caminho correto e linear a seguir para quem não enxerga, todavia, quando existe padronização, nivelamento e faixa livre para caminhar nas calçadas, assim como a presença de algum elemento contínuo ao deslocamento, como por exemplo, o alinhamento predial ou grama na faixa de serviços ou de acesso, torna seu emprego facultativo. Se empregado, o revestimento adjacente deve ser limpo de relevos e texturas para que o tato da pista tátil ganhe destaque e cumpra com sua função;
– Os pisos táteis são imprescindíveis nas travessias de pedestres, ao menos o tipo alerta, pois há perigo potencial. Quando acompanhado do tipo direcional, auxilia para informar o sentido da travessia, inclusive durante e sobre a faixa de pedestres;
– Os semáforos para pedestres devem conter, além do dispositivo visual, a forma sonora ou tátil para que o pedestre com cegueira saiba que é sua vez de atravessar. A caixa de solicitação de travessia pode vir acompanhada de layout tátil da via, informando o leitor a quantidade de pistas que terá de atravessar;
– Junto às placas visuais de nomenclatura de ruas pode haver inscrição tátil (braille e letras em relevo) dessa informação no próprio poste que sustenta as placas;
– Mapas e maquetes visuais e táteis podem ser dispostos em locais mais abertos, como praças, apresentando a configuração espacial da região e o acesso ao sistema de transporte coletivo.

Nos pontos de embarque e desembarque (pontos, abrigos e estações):
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– Sistema de informação ao usuário acerca das linhas, horários, itinerários, tarifas e outras informações através de painéis visuais (fixos e/ou digitais), mapas, anúncios de áudio sobre a chegada das linhas nos locais de parada e sistema tátil (composto por pisos, mapas e/ou painéis) que informem e orientem o usuário para as respectivas linhas e acesso aos veículos;
– No caso de abrigos e estações, oferecer cobertura e proteções laterais, conforme direção dos ventos e posição solar, visando o conforto térmico do usuário; banco que propicie visualização da chegada do veículo; espaço para pessoas em cadeira de rodas e carrinhos de bebê; marcação tátil e com contraste visual no piso do local de embarque;
– Garantir o nivelamento do local de embarque com o veículo, seja pelo piso baixo e rampa na frota, seja pela plataforma de embarque/desembarque;
– Dispositivo ou meio para que seja possível solicitar auxílio de funcionário em estações, principalmente no caso de usuário com deficiências múltiplas.

Nos veículos:
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– Nivelamento do embarque e desembarque através da frota com piso baixo ou nivelamento com plataformas em estações. Além de possibilitar igualdade de acesso entre pessoas sobre rodas (carrinho de bebê, cadeira de rodas), facilita e acelera o tempo de embarque e desembarque de todos os passageiros, especialmente aqueles que estejam com mobilidade reduzida, como idosos, pessoas com compras / malas, com muletas, grávidas, etc.
– Sistema de informação interno através de letreiros, painéis visuais e anúncios de áudio, principalmente sobre o itinerário, próxima parada e destino final, que podem ser complementados com descrições sobre o percurso (rua que está passando), hora, anúncios gerais sobre o sistema e também com fins educativos e culturais;
– Alto contraste do layout interno e externo, principalmente na presença de degraus;
– Letreiros digitais com alto contraste fundo-figura e letras grandes, com número e destino da linha, nas partes frontal e lateral externas do veículo;
– Ausência de catracas internas (preferir cobrança prévia – através de cancelas) ou utilizar catracas de 3 braços (catracas de 4 braços devem ser retiradas, pois dificultam o uso por todos e impedem o uso de pessoas que estejam com mobilidade reduzida temporária – como utilizando muletas ou mesmo segurando sacolas ou malas, por exemplo, ou condições permanentes, como a redução das funções motoras em idosos);
– Bancos confortáveis e com layout interno variado. Prever assento preferencial demarcado de forma visual e tátil para grávidas, pessoas com crianças de colo, idosos, pessoas com deficiência;
– Espaços para pessoas em cadeira de rodas, carrinhos de bebê, cães-guia, compras, etc. – os assentos podem ser rebatidos e utilizados quando esse espaço não for utilizado;
– Botões de solicitação de parada com alto contraste visual e demarcação tátil, de preferência, ao lado / próximo de cada conjunto de assentos, para que a pessoa não necessite levantar para solicitar a parada.

Informação Digital e Complementar:
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– Aplicativo e/ou sistema na página da empresa de transporte que permita que os usuários consultem horários, itinerários, selecionem preferências de planejamento de viagem e outras informações através de smartphone ou dispositivo disponível nos pontos de embarque;
– Materiais informativos em formato digital (texto, áudio ou vídeo) ou em papel por panfletos e livretos, que podem ser solicitados em impressão ampliada, preto e branco, alto contraste ou mesmo em Braille, acerca do meio urbano e do sistema de transporte, linhas, itinerários, horários, estações, assim como dicas de mobilidade, descrevendo o sistema e como o usuário pode realizar cada ação: desde a origem (de sua residência ou trabalho, por exemplo); encontrando um ponto de embarque; embarcando; durante a viagem; desembarcando; e encontrando seu destino.
– Descrição das estações e do itinerário das linhas, as quais podem ser disponibilizadas em painel digital local ou de forma virtual, na página da empresa de transporte, que com um leitor de tela, configurar-se-á em uma áudio-descrição das estações de embarque e percursos.

Assista a palestra proferida por Carolina sobre o tema no Seminário sobre Mobilidade Urbana da Região Metropolitana da Grande Florianópolis em 21 de maio de 2018 através do link:

SILVEIRA, Carolina Stolf. Orientação e Mobilidade de Pessoas com Deficiência Visual no Meio Urbano e no Transporte Coletivo: Subsídios para Sistemas de Informação ao Usuário. Tese. PósARQ, UFSC. Florianópolis, 2017. 356p.

SILVEIRA, Carolina Stolf. Acessibilidade Espacial no Transporte Público Urbano: Estudo
de Caso em Joinville-SC. Dissertação. PósARQ, UFSC. Florianópolis, 2012. 210p.

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